Três versões e um mistério
Deborah Berlinck – Enviada especial de O Globo
O Globo - 05/10/2011
Qual o mistério que envolve o pai de Dilma Roussef ? |
A presidente Dilma Rousseff virou capa de livro na Bulgária: sua foto, com a faixa presidencial, estava estampada ontem nas vitrines de várias livrarias da capital. Mas o livro "Dilma Rousseff", escrito pelos jornalistas búlgaro Monchil Indjov e o brasileiro Jamil Chade, vai além da trajetória de Dilma: é a saga de duas famílias separadas por uma cortina de ferro durante a Guerra Fria - um drama que foi vivido por milhares de pessoas nesta época crucial da História do século 20.
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Começa com um drama de família: um homem, Peter Russev, que escapou da Bulgária deixando a mulher búlgara, grávida, sumindo por 18 anos e formando outra família no Brasil.
Este homem é o pai de Dilma. E é também a história de dois irmãos - Dilma e seu meio-irmão Luben - que, separados por um oceano e sem saber um do outro, tomam caminhos opostos. No Brasil, Dilma Rousseff lutava sob a bandeira dos comunistas contra a ditadura. Na Bulgária, o meio-irmão era perseguido por um regime comunista que o puniu por ter um pai que fugiu para o chamado "Ocidente podre". Sua carreira de engenheiro nunca foi muito longe por conta disso.
Mas o que realmente levou Peter Russev - transformado no Brasil em PedroRousseff - a fugir da Bulgária? Este é um mistério que os autores acreditam que nunca irão desvendar. O búlgaro Monchil Indjov explica que há três versões. A primeira, ele ouviu da própria Dilma: o pai escapou da Bulgária por motivos politicos. Mas Indjov, analisando as datas, não acredita nisso:
- Dilma me disse em 2004 que ele fugiu da Bulgária porque era simpatizante dos comunistas. Isso não é muito lógico. Os comunistas organizaram protestos em 1923, e, em 1925, promoveram um dos maiores atentados na Europa, em Sófia, quando quase 200 pessoas morreram. Mas Luben só saiu da Bulgária em 1929, quando já não havia problema (com os comunistas) - explica.
Jamil Chade acrescenta: comunista que saía da Bulgária ia para Moscou e não para o Ocidente capitalista. Depois da entrevista com Dilma, quando ela ainda era ministra das Minas e Energia no governo Lula, Indjov foi encontrar o meio-irmão Luben, em Sófia. E lá ouviu a segunda versão: Pedro Rousseff, um comerciante de peles e tecidos, teria saído da Bulgária por motivos financeiros - estava quebrado.
- Luben me contou que Peter (Pedro Rousseff) prometeu à sua primeira esposa, Evdokia Yankova, que era uma escritora infantil muito conhecida na Bulgária, que ia voltar. E não voltou - diz o jornalista búlgaro.
Quanto mais fundo ia na história, mais obscuros ficavam os motivos da escapada. Surgiu, então, a terceira versão. Numa conversa com um tio de segundo grau de Dilma, Tzonyu Kornazhev (primo de Pedro Rousseff), Indjov ouviu que o pai de Dilma era "um aventureiro irresponsável". O tio de Dilma havia ouvido isso do próprio pai, Zahari Ornazhev, também comerciante de pele, que contou ter emprestado dinheiro a Peter Rousseff.
- O que ele me contou, de forma muito diplomática, é que Peter usou o dinheiro. E só anos mais tarde, no Brasil, mandou cartas para Zahari pedindo desculpas "pelo feito" - disse o jornalista, acrescentando que as primeiras cartas só foram escritas em 1948.
Hoje, o jornalista búlgaro afirma:
- Acho que nunca vamos saber.
Nos 18 anos em que o pai de Dilma ficou sem contato com a família na Bulgária, todo mundo acreditava que ele havia morrido, exceto sua mãe, Tzana Russeva, e sua irmã, Pia. Para o jornalista búlgaro, ficou claro que Luben Russev - que nunca conheceu o pai - morreu magoado. O pai chegou a se corresponder com ele, e Luben teria pedido várias vezes para ir ao Brasil encontrá-lo. Mas nunca teve resposta. Dilma planejou várias vezes encontrar o meio-irmão, mas ele morreu em 2007, antes que isso fosse possível.
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