Repare no ambiente - privilegiado - em que estava o autor, um civil, Miguel Pellicciari.
O 31 DE
MARÇO DE 1964
O que eu sei é o que eu vi naquela época. Almino Alfonso,
Darcy Ribeiro e outros fazendo conferencia na USP onde eu cursava o
quarto ano de Engenharia, e onde o Serra era meu colega e ainda presidia
a UNE.
Eles mostravam como seria o Brasil depois das tais reformas de
base. Nada mais nada menos que transformar em mais um satélite da antiga
URSS, como já era Cuba na América. Assustava, mas impressionava a
platéia. Meia dúzia de paus mandados aplaudia entusiasticamente da mesma
forma como fazem hoje, para dar clima de euforia. A perplexidade era
geral, e até os mais céticos estavam preocupados.
No entanto, havia uma
esperança dada a resistência dos governos de São Paulo, Minas e do Rio
de Janeiro, que com tropas leais, estavam dispostos a enfrentar a coisa.
É bom que fique claro,
portanto, que não foram só os militares que entraram em cena, mas
governos Civis e a própria população saindo na rua clamando e
protestando contra o que estava por vir.
Acho até que foi a precipitação
do General Mourão Filho, partindo com suas parcas tropas de Juiz de
Fora, quem forçou a entrada dos Militares na coisa. Lembro-me
perfeitamente quando o Comandante do II Exército sediado em S. Paulo,
General Kruel, e que havia sido ministro do próprio Jango, propôs a ele
endurecer com as esquerdas para que as coisas pudessem acalmar. Sem
êxito, acabou marchando com os outros comandantes para sitiar o Estado
da Guanabara, dando inicio ao movimento. Na verdade, foi um alivio geral
e disso, lembro-me muito bem. pouca gente foi contra, mas aceitaram como
a melhor solução para o momento. A paz voltou e o Brasil pôde caminhar
novamente.
Lembro-me ainda, e muito bem, que as coisas passaram a
melhorar a tal ponto em relação aos governos
anteriores, que não havia quem não estivesse satisfeito. O Brasil
progredia, e havia real crescimento econômico batendo alguns anos depois
nos 10/11 %.
O governo militar foi fartamente apoiado. Até amigos e
antigos políticos da esquerda se sentiram surpresos e satisfeitos.
Aliás, o crescimento era realmente sentido e não como os de hoje, puras
mentiras fartamente ditas pelos governantes para um povo que não sabe
ler índice econômico. Não havia corrupção nem bandidagem. E nenhum
General presidente ou ministro ficou rico como depois.
Tudo ia bem, até
colocarem a bomba nos Guararapes em Recife. Foi uma surpresa a todos. A
partir daí soubemos da existência de um movimento terrorista. Foi
quando, então, o governo emitiu o AI - 5 e a coisa endureceu. Portanto, a
mim ninguém engana e não faz a historia mudar como estão tentando
fazer. Havia paz e prosperidade sim e não havia manifestação contra o
regime instalado, muito pelo
contrário. Apenas ações extremistas pipocavam, e isso é importante,
totalmente condenadas pela grande maioria da população. A grande verdade
é essa.
Além disso, essas ações só atrapalharam porque acabaram por
prolongar ainda mais o retorno à normalidade institucional, e que só
aconteceu por meios pacíficos, quando o terror já estava extinto. Jamais lutaram contra o regime, mas para instalar um outro regime. E, os
torturados não foram pessoas que trabalhavam, produziam e viviam em paz,
mas apenas e tão somente aqueles que radicalizaram.
Disso eu sei por
que eu conhecia muitas pessoas que por fanatismo ou por indução acabaram
sendo perseguidas. Eu precisava falar disso porque eu tenho visto, lido
e ouvido tanta besteira e principalmente mentiras que tem me enojado.
Fui testemunha viva e quero deixar claro, eu também fui e sou contra o
Regime Militar assim como eram muitas pessoas e até muitos militares.
Mas fui a favor da ação na
época. Era um mal necessário. Não havia outra saída.
O grande problema é
que os terroristas de ontem conseguiram chegar democraticamente ao
poder, até com a ajuda da imprensa e de empresas. Mas não tenham
duvidas, o que eles não querem é manter a democracia. Chegaram lá, mas
não vão sair facilmente, igualzinho ao que o Hugo Chavez fez na
Venezuela.
Para complicar, hoje as forças armadas estão enfraquecidas.
Há tempos estão sendo desprezadas e não existem mais generais e oficiais
como os de antigamente. Então, pouco se pode contar com eles. Hoje,
pretende-se que sejam também aparelhadas para servir ao Governo e não
ao Brasil, com o único objetivo de manter-se no poder.
Uma pena que
estejam aceitando isso também. Essa tal comissão da verdade era o que
faltava para pisar ainda mais no calo. Só humilhação. Agora abaixaram a
cabeça e nem comemoração pelo 31 de Março vai haver.
É o fim.
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