28 de dez. de 2010


POBRE BRASIL, FILHO BASTARDO  DE PORTUGAL

     "Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.  
     Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverossímeis no Limoeiro. 
     Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País. 
     A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.  
     Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar."
     Guerra Junqueiro, 1896.

Ao divulgar esse texto, deve-se salientar que tal momento se dava em Portugal, em 1896.
Cento e quatorze anos depois, ao Brasil, sem tirar nem por, cabem as mesmíssimas palavras. Lá e cá, tudo indica, nada mudou, antes piorou muito.
Haverá algum engano ? 
Na data não há certamente, porque a data é a corrente!
E quem disser o contrário certamente que mente. 
A nação brasileira foi sobressaltada com a atitude dos parlamentares de se darem aumento utilizando o percentual astronômico de 61,83%.
O índice é três vezes maior do que a inflação. De fevereiro de 2007 a novembro de 2010, o IPCA, índice oficial de preços, foi de 20,9%. Apressaram em justificar esse inusitado aumento com a Constituição Federal, que prevê salários iguais aos dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Não obstante o artigo 37, inciso XI, da CF se preocupar mais com o limite dos subsídios, os deputados acharam uma brecha para invocar a igualdade remuneratória.
Afinal aqui tudo acaba em Carnaval.

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