3 de jul. de 2012

O DISCURSO TERRORISTA

Quando sequestraram o embaixador Elbrick, em 1969, os autores do atentado exigiram a divulgação, em toda a grande mídia, de um longo manifesto. Imaginem o constrangimento imposto ao governo: locutor oficial proclamando à nação um libelo contra o regime. O texto foi exibido. O país parou para ouvir, ver e ler. Redigira-o o jornalista Franklin Martins, um dos sequestradores. Oportunidade dourada para os insurretos afirmarem seus compromissos com a democracia e cobrá-los do governo, não é mesmo? 
Treze presos terroristas trocados pelo embaixador Elbrick - dois outros seriam acrescentados no meio da viagem - na base aérea do Galeão, Rio de Janeiro, antes de partirem para o exílio no México


Qual o quê ! 

O texto (íntegra em "Charles Burke Elbrick" na Wikipedia) foi uma catilinária comunista que falava do que os terroristas entendiam: ideologia, violência, "justiçamentos", vingança, sequestros, assaltos, terrorismo.

A carta

A carta-manifesto, que pedia a libertação de quinze terroristas em troca de Elbrick, foi escrita por Franklin Martins sob supervisão de Joaquim Câmara. Nela, a ALN e a DI-GB (assinando como MR-8) assumiam a autoria do sequestro. Foi lida em cadeia nacional de rádio e televisão. Seu texto integral:

“Grupos revolucionários detiveram hoje o sr. Charles Burke Elbrick, embaixador dos Estados Unidos, levando-o para algum lugar do país, onde o mantêm preso. Este ato não é um episódio isolado. Ele se soma aos inúmeros atos revolucionários já levados a cabo: assaltos a bancos, nos quais se arrecadam fundos para a revolução, tomando de volta o que os banqueiros tomam do povo e de seus empregados; ocupação de quartéis e delegacias, onde se conseguem armas e munições para a luta pela derrubada da ditadura; invasões de presídios, quando se libertam revolucionários, para devolvê-los à luta do povo; explosões de prédios que simbolizam a opressão; e o justiçamento de carrascos e torturadores.

Na verdade, o rapto do embaixador é apenas mais um ato da guerra revolucionária, que avança a cada dia e que ainda este ano iniciará sua etapa de guerrilha rural. 

Com o rapto do embaixador, queremos mostrar que é possível vencer a ditadura e a exploração, se nos armarmos e nos organizarmos. Apareceremos onde o inimigo menos nos espera e desapareceremos em seguida, desgastando a ditadura, levando o terror e o medo para os exploradores, a esperança e a certeza da vitória para o meio dos explorados. 

O sr. Burke Elbrick representa em nosso país os interesses do imperialismo, que, aliados aos grandes patrões, aos grandes fazendeiros e aos grandes banqueiros nacionais, mantêm o regime de opressão e exploração. 

Os interesses desses consórcios de se enriquecerem cada vez mais criaram e mantêm o arrocho salarial, a estrutura agrária injusta e a repressão institucionalizada. Portanto, o rapto do embaixador é uma advertência clara de que o povo brasileiro não lhes dará descanso e a todo momento fará desabar sobre eles o peso de sua luta. Saibam todos que esta é uma luta sem tréguas, uma luta longa e dura, que não termina com a troca de um ou outro general no poder, mas que só acaba com o fim do regime dos grandes exploradores e com a constituição de um governo que liberte os trabalhadores de todo o país da situação em que se encontram. 

Estamos na Semana da Independência. O povo e a ditadura comemoram de maneiras diferentes. A ditadura promove festas, paradas e desfiles, solta fogos de artifício e prega cartazes. Com isso, ela não quer comemorar coisa nenhuma; quer jogar areia nos olhos dos explorados, instalando uma falsa alegria com o objetivo de esconder a vida de miséria, exploração e repressão em que vivemos. Pode-se tapar o sol com a peneira? Pode-se esconder do povo a sua miséria, quando ele a sente na carne? 

Na Semana da Independência, há duas comemorações: a da elite e a do povo, a dos que promovem paradas e a dos que raptam o embaixador, símbolo da exploração. 

A vida e a morte do sr. embaixador estão nas mãos da ditadura. Se ela atender a duas exigências, o sr. Burke Elbrick será libertado. Caso contrário, seremos obrigados a cumprir a justiça revolucionária. Nossas duas exigências são: 

a) A libertação de quinze prisioneiros políticos. São quinze revolucionários entre os milhares que sofrem as torturas nas prisões-quartéis de todo o país, que são espancados, seviciados, e que amargam as humilhações impostas pelos militares. Não estamos exigindo o impossível. Não estamos exigindo a restituição da vida de inúmeros combatentes assassinados nas prisões. Esses não serão libertados, é lógico. Serão vingados, um dia. Exigimos apenas a libertação desses quinze homens, líderes da luta contra a ditadura. Cada um deles vale cem embaixadores, do ponto de vista do povo. Mas um embaixador dos Estados Unidos também vale muito, do ponto de vista da ditadura e da exploração. 

b) A publicação e leitura desta mensagem, na íntegra, nos principais jornais, rádios e televisões de todo o país. 

Os quinze prisioneiros políticos devem ser conduzidos em avião especial até um país determinado _ Argélia, Chile ou México _, onde lhes seja concedido asilo político. Contra eles não devem ser tentadas quaisquer represálias, sob pena de retaliação. 

A ditadura tem 48 horas para responder publicamente se aceita ou rejeita nossa proposta. Se a resposta for positiva, divulgaremos a lista dos quinze líderes revolucionários e esperaremos 24 horas por seu transporte para um país seguro. Se a resposta for negativa, ou se não houver resposta nesse prazo, o sr. Burke Elbrick será justiçado. Os quinze companheiros devem ser libertados, estejam ou não condenados: esta é uma “situação excepcional". Nas "situações excepcionais", os juristas da ditadura sempre arranjam uma fórmula para resolver as coisas, como se viu recentemente, na subida da junta militar. 

As conversações só serão iniciadas a partir de declarações públicas e oficiais da ditadura de que atenderá às exigências. 

O método será sempre público por parte das autoridades e sempre imprevisto por nossa parte. 

Queremos lembrar que os prazos são improrrogáveis e que não vacilaremos em cumprir nossas promessas. 

Finalmente, queremos advertir aqueles que torturam, espancam e matam nossos companheiros: não vamos aceitar a continuação dessa prática odiosa. Estamos dando o último aviso. Quem prosseguir torturando, espancando e matando ponha as barbas de molho. Agora é olho por olho, dente por dente.” 

—  Ação Libertadora Nacional (ALN)/Movimento Revolucionário 8 de outubro (MR8)— 

Relação dos terroristas trocados pelo embaixador 

Luís Travassos
José Dirceu
Vladimir Palmeira
José Ibrahin
Flávio Tavares
Gregório Bezerra
Ricardo Vilas Boas
Ricardo Zaratini
Rolando Fratti
Mário Zanconato
Leonardo Rocha
Maria Augusta Carneiro


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