4 de set. de 2012

Marketing social

Luiz Felipe Pondé
Íntegra de artigo publicado na Folha de São Paulo


1. Ser gay está na moda.

2. Ter filha solteira é legal. Mulher não precisa de homem. 

3. Não dou valor a dinheiro. 

4. Não tenho preconceito. 

5. Os homens hoje lidam bem com mulheres que ganham mais do que eles. 

6. Minha tia é muito bem resolvida. 

7. Vivemos uma crise de valores. Meus valores não são materiais. 

8. Existem pessoas que não se vendem. 

9. Meu pai me ensinou a ser digno. 

10. Não tenho religião, tenho espiritualidade. 

LUIZ FELIPE PONDÉ*
Eis alguns exemplos de papo-furado contemporâneo. Trata-se de marketing social. Filho do politicamente correto, grande exercício de lixo cultural. 

O marketing social vende mentiras como verdades porque serve a agendas ideológicas de quem as produz. As outras pessoas apenas as repetem para aliviar seus fracassos pessoais ou para vender uma boa imagem social de si mesmas. 

Como sempre, a mentira rege o mundo. Não somos mais pecadores, mas continuamos mentirosos. Eliminou-se da agenda moral a consciência do mal como parte de nós mesmos, ficou apenas o hábito contumaz da mentira. 

Eis dez teses contra o marketing social: 

1. Ser gay não está na moda. A maioria esmagadora do mundo é indiferente ao tema. Isso não significa nada "contra". Se não fosse o fato de grande parte das pessoas que trabalha com cultura (mídia, arte, universidade) ser gay, ninguém daria bola para o assunto. A própria "teoria de gênero" que afirma que você pode ser sexualmente o que quiser é uma invenção de militantes gays e feministas. Além, é claro, da grana que grande parte da população gay tem por ser constituída de profissionais altamente qualificados que não têm filhos, até "ontem". Agora, ficarão pobres como os héteros. 

2. Mãe solteira é péssimo. E, sim, mulher precisa de homem. Sem homem, a maioria revira no vazio da cama. E vice-versa. Mãe solteira é opção para quem não tem mais opção afetiva ou é coisa de gente altamente narcisista. E para a criança é péssimo. Gente que abraça o marketing social, além de mentirosa, é muito egoísta. O mundo inteligentinho está cheio de gente ressentida que prega essa bobagem. 

3. Todo mundo dá valor a dinheiro, principalmente quando não tem. Quem mais diz que não dá valor a dinheiro, é justamente quem mais dá. Dizer "não dou valor a dinheiro" prepara o terreno para se pedir dinheiro emprestado ou justificar dívidas não pagas. 

4. Todo mundo tem preconceito. Quem diz que não tem, normalmente acha meninas virgens doentes, mulheres que cuidam dos filhos umas idiotas, religiosos burros, os EUA uma nação do mal e Obama um santo. A maioria continua tendo preconceito contra gay, mulher que transa muito e homem chorão. Eu, por exemplo, tenho preconceito contra gente bem resolvida e que diz que não tem preconceito. 

5. Nenhum homem lida bem com mulheres que ganham mais do que ele. A menos que ele tenha problema de caráter. É sempre um sofrimento que se enfrenta dia a dia, sonhando com seu fim. Nem as mulheres bem-sucedidas lidam bem com homens fracassados. Muitas "rezam" para que seus maridos falidos ganhem mais ou, pelo menos, o mesmo que elas. 

6. Ninguém é bem resolvido, somente os mentirosos, principalmente tias solitárias que fingem ser donas de seus afetos. 

7. Valores são sempre materiais, ligados a poder, patrimônio, sucesso, reconhecimento. Não existe "crise de valores" porque nunca existiram valores sólidos, a moral pública sempre foi fundada na hipocrisia e na superficialidade de julgamento do comportamento alheio. 

8. Todo mundo tem um preço, sempre menor do que se imagina. Às vezes as pessoas se vendem por muito menos do que dinheiro, se vendem por afetos baratos, promessas falsas e deuses vagabundos. 

9. Aprende-se muito pouco com os pais, na maior parte do tempo, o que nos define é o temperamento e as circunstâncias da vida. Aristóteles mesmo dizia que ética é uma ciência imprecisa dominada pela contingência. Quem elogia demais os pais, está ocultando suas vergonhas. 

10. Esse negócio de "espiritualidade" é religião sem compromisso. Produto de butique. Pessoas "espiritualizadas" são normalmente as piores e mais indiferentes.


Luiz Felipe de Cerqueira e Silva Pondé (Recife, 1959) é um filósofo e ensaísta brasileiro. Fez seu doutorado pela Universidade de São Paulo (USP) e pela Universidade de Paris - VIII. Recebeu o título de pós-doutor da Universidade de Tel Aviv. Atualmente é Vice-Diretor e Coordenador de Curso da Faculdade de Comunicação da FAAP; professor de Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e de Filosofia na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP).
     
Escreve semanalmente na Folha de S.Paulo e é autor de vários livros, entre eles "O homem insuficiente: Comentários de Psicologia Pascaliana" (2001) e "Conhecimento na desgraça: Ensaio da Epistemologia Pascaliana" (2004), "Crítica e profecia: filosofia da religião em Dostoiévski" (2003), "Do pensamento no deserto: Ensaio de Filosofia, Telogia e Literatura" (2009) e "Contra um mundo melhor: Ensaios do Afeto "(2010), "O Catolicismo Hoje" (2011), "Guia Politicamente Incorreto da Filosofia" (2012). É co-autor do livro "Por que virei a direita: Três intelectuais explicam sua opção pelo conservadorismo" (2012).



2 de set. de 2012

A transferência do crente

Idalina trabalhava na casa de um médico em São Paulo. Durante anos foi o anjo de guarda da família. Cuidava da limpeza, da cozinha e da roupa. E ajudou a criar os filhos, que, como todos, a adoravam. Um dia, muito sem jeito e com os olhos cheios de lágrimas, Idalina anunciou que ia embora. 

O médico, a mulher, os filhos ficaram todos em pânico:

- O que é que aconteceu, Idalina? Algum problema? Precisando de dinheiro? Vamos conversar. Quem sabe a gente dá um jeito, aumenta seu salário?

- Não é nada disso não, doutor. É a igreja. Nós somos evangélicos e a nossa igreja transferiu meu marido para o Paraná e eu tenho que ir com ele.

- Seu marido é pastor?

- Não, doutor. O pastor é que vai nos levar com ele.

- Se seu marido não é pastor, pode muito bem ser substituído por outra pessoa.

- Não pode não, doutor. O pastor só confia em meu marido, disse que ele é insubstituível, que ele é muito importante!

- Mas afinal, que diabos que seu marido faz na igreja?

- Ele é o aleijado que levanta e sai andando...


TIO DREW ARRASANDO NO BASQUETE